O aborto de repetição é definido como a ocorrência de três ou mais interrupções involuntárias da gravidez antes da 22a semana, ou seja, até o quinto mês de gestação.
O abortamento espontâneo é relativamente frequente entre as mulheres. Aproximadamente 20% das gestações não evoluem e, geralmente, se deve a alguma alteração cromossômica do embrião que inviabiliza a vida.
Entretanto, quando esta situação ocorre pelo menos três vezes de forma consecutiva é considerado aborto de repetição e deve ser investigado pelo casal para descobrir a origem do problema.
São várias as causas que podem originar o aborto de repetição. Neste sentido, uma investigação cautelosa de cada caso precisa ser realizada.
Dessa maneira, o especialista em reprodução humana deve solicitar uma série de exames ginecológicos, genéticos e imunológicos, além de fazer uma avaliação da história familiar e clínica do casal para tentar descobrir o motivo dos sucessivos abortos. Com diagnóstico preciso de cada paciente, os médicos e embriologistas podem, então, definir o melhor tratamento para evitar novas perdas.
Existem algumas causas de aborto de repetição que podem ser diagnosticadas por exames.
Alterações genéticas
As anomalias cromossômicas fetais são a causa mais comum de aborto espontâneo antes das 10 semanas de gravidez. Nesse sentido, quanto maior a idade materna, mais chance de ocorrer abortos de repetição. Os erros mais comuns são a trissomia, poliploidia e monossomia do cromossoma X.
O exame de análise citogenética deve ser realizado a partir da terceira perda consecutiva. Caso este exame revele anomalias, é indicado proceder à análise do cariótipo através do sangue periférico do casal.
Anomalias anatômicas
As anomalias uterinas, como malformações müllerianas, miomas, pólipos e sinéquias uterinas, podem também estar associadas ao aborto de repetição. Desta forma, todas as mulheres que tiveram sucessivos abortos devem ser submetidas a um exame da cavidade uterina, por ecografia pélvica com sonda transvaginal 2D ou 3D e histerossalpingografia, que podem ser complementadas com endoscopia.
Trombofilias
As trombofilias são doenças que provocam alterações na coagulação do sangue e que aumentam a chance de formar coágulos sanguíneos e causar tromboses, que podem impedir a implantação do embrião no útero ou provocar abortos. Geralmente, as trombofilias não são detectadas em exames de sangue comuns.
Causas imunológicas
Durante a gestação, o embrião é considerado um corpo estranho pelo organismo da mãe, geneticamente diferente. Para isso, o sistema imune materno tem que se adaptar para não rejeitar o embrião. No entanto, em alguns casos, isto não acontece, levando à ocorrência de abortos ou à dificuldade para engravidar.
Existe um exame chamado de cross-match, que pesquisa a presença de anticorpos contra linfócitos paternos no sangue da mãe. Para realizar este exame, retiram-se amostras de sangue do casal e realiza-se uma prova cruzada entre os dois, para identificar a presença de anticorpos.
Sabe-se que os hábitos de vida influenciam diretamente na gravidez, podendo causar aborto de repetição. Nesse sentido, o casal deve ser orientado a seguir um estilo de vida saudável:
● Não fumar;
● Consumir pouco álcool e cafeína;
● Praticar exercício moderado;
● Controlar o peso e cuidar da alimentação;
● O uso de drogas também está associado a um maior risco de aborto de repetição,
uma vez que influencia negativamente na saúde do corpo humano.
● Para as mulheres, é indicada a suplementação de ácido fólico e progesterona e, muitas vezes, é necessário suporte psicológico para que o casal, abalado pelas perdas prévias, não desista de tentar uma nova gravidez.
Além disso, é importante ressaltar que, melhorando os hábitos de vida, a chance de se ter uma gestação normal é de 50 a 75%, dependendo da idade da mulher e do número de abortos prévios.
O aborto de repetição também pode estar ligado ao fator masculino. Em geral, os médicos concentram a atenção nas mulheres quando procuram as causas de abortos recorrentes, mas a saúde dos homens e de seus espermatozoides também devem ser analisados, pois podem influenciar na gravidez.
A descoberta a esse respeito é de um novo estudo do Colégio Imprerial de Londres e publicada no jornal científico Clinical Chemistry. Na pesquisa, os cientistas avaliaram a qualidade do esperma de 50 homens com parceiras que haviam passado por três abortos consecutivos. A partir daí, descobriram que os espermatozoides deste grupo apresentavam um nível maior de DNA danificado do que os de homens com parceiras que não tiveram abortos espontâneos.
O autor do estudo Channa Jayasena afirmou que a pesquisa é importante para mostrar que, muitas vezes, os dois parceiros estão envolvidos em casos de abortos de repetição.
Na maior parte das vezes, a consulta de Reprodução Humana é para investigação de infertilidade, ou seja, dificuldade de engravidar. Entretanto, alguns casos são de pacientes que engravidam facilmente, mas a gestação não evolui, tendo abortos de repetição.
Neste sentido, a ASRM (American Society for Reproductive Medicine) indica a realização de uma criteriosa investigação, pois, na maioria das vezes, é possível diagnosticar e tratar a causa sucessiva de abortamentos.
Como já vimos aqui, a maioria dos abortos espontâneos, independentemente de se repetirem ou não, são devidos a anormalidades cromossômicas, e se deve a uma chance aleatória (no processo de desenvolvimento embrionário) ou idade materna avançada. Entretanto, quando isso acontece repetidas vezes, temos que investigar outras causas.
Muitas doenças que causam infertilidade podem gerar aborto de repetição e, se forem tratadas, resultam em gestações bem sucedidas. Neste sentido, as estatísticas revelam que duas em cada três mulheres com acompanhamento adequado nestes casos terão uma gestação normal na próxima vez.
A medicina reprodutiva evoluiu tanto que hoje contamos com tratamentos eficazes para quase todas as causas de aborto de repetição. Mesmo assim, em algumas situações, os especialistas encontram casos mais difíceis de resolver ou não acham explicações, apesar de todos os exames terem sido realizados.
Nesses casos, uma possibilidade para se atingir o sucesso de uma gravidez saudável é a Fertilização in vitro acompanhada de biópsia embrionária, para diagnóstico de alterações cromossômicas do embrião (PGT-A – Teste Genético Pré-Implantacional para Aneuploides). Desta forma, só os embriões saudáveis serão transferidos para o útero, diminuindo as chances de aborto de repetição.
Vale ressaltar que a melhor opção de tratamento deve ser proposta por um médico, após diagnóstico rigoroso de cada caso.
Então, se você passou ou está passando por aborto de repetição, lembre-se de que você pode ter esperança. Procure um especialista e faça uma investigação completa para descobrir a origem do seu problema. Nesse sentido, sua chance de ter uma gestação com sucesso na próxima vez pode chegar a 70%.
Escrito por Dr. Nilo Frantz, ginecologista, obstetra e especialista em reprodução humana
CRM RS 4012
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